Por Inara Fonseca
A abertura do evento contou com a participação de Joana Nunes, Coordenadora-Geral de Bioeconomia e Ciências Exatas, Humanas e Sociais do Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação; Andreza Xavier, Diretora da Secretaria Nacional de Articulação Institucional, Ações Temáticas e Participação Política do Ministério das Mulheres; Maria Emília Walter, Decana de Pesquisa e Inovação da UnB; e Deborah Santos, Secretária de Direitos Humanos da UnB.
Na última semana, de 29 a 31 de outubro, o Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), recebeu cerca de 200 pesquisadoras de distintas áreas do conhecimento, para compartilhar pesquisas científicas e pensar estratégias voltadas à promoção da equidade, diversidade e inclusão de gênero e étnico-racial nas ciências. Ao todo, estiveram representadas 13 universidades brasileiras e quatro internacionais nas mesas de debate e conferências do evento, com participação de pesquisadoras da Argentina e do Uruguai. Além disso, a solenidade de abertura contou com a presença da Coordenadora-Geral de Bioeconomia e Ciências Exatas, Humanas e Sociais do Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação, Joana Nunes; da Diretora da Secretaria Nacional de Articulação Institucional, Ações Temáticas e Participação Política do Ministério das Mulheres, Andreza Xavier; da Decana de Pesquisa e Inovação da UnB, Maria Emília Walter; e da Secretária de Direitos Humanos da UnB, Deborah Santos.
“Foi um primeiro encontro presencial com praticamente todas as participantes do INCT Caleidoscópio, reunindo as integrantes do Comitê Gestor, as nossas seis pós-doutorandas, bolsistas de Iniciação Científica e Apoio Técnico e com presença de muitas pesquisadoras integrantes das nucleações do Observatório Caleidoscópio (coordenação Sul/Sudeste) e da Incubadora Norte-Nordeste e Amazônia Legal. Também foi um momento importante de apresentação, às nossas parceiras internacionais, do trabalho ramificado e denso realizado pelo INCT Caleidoscópio, em suas várias pesquisas em andamento e reflexões sobre o que precisamos avançar para os próximos anos”, explicou Karla Bessa (Unicamp), vice-coordenadora do INCT Caleidoscópio.
Espaços horizontais de diálogo e de fortalecimento também marcaram a programação do I Seminário Internacional do INCT Caleidoscópio. O Painéis de Redes, onde ocorreram comunicações integradas de redes de pesquisa, foi um espaço privilegiado de aprendizado e internacionalização, devido ao alinhamento entre os temas de investigação dos grupos de pesquisa e a experiência das pesquisadoras envolvidas. Já o Conversatório possibilitou a integração e a troca entre estudantes, pesquisadores e ativistas. Durante o Conservatório foi possível ouvir: 1) os desafios de estudantes quilombolas e indígenas de inclusão e de pertencimento no âmbito da Universidade de Brasília; 2) uma representante do Ministério das Mulheres sobre a luta do Ministério para ter orçamento próprio e, com isso, fomentar o debate sobre equidade e diversidade; 3) o desafio de exercer um mandato político e ser uma pessoa LGBTQIA+, visto que ainda há ainda muito preconceito.
Mulheres e resistência nas ciências marca primeiro dia
A resistência das mulheres nas ciências foi o foco dos debates no primeiro dia de evento. “Mesmo tendo ocupado número significativo de vagas no crescimento das universidades depois da reforma universitária de 1970, as mulheres estiveram à margem dos recursos do sistema de ciência e tecnologia e dos cargos de poder e representação acadêmica até recentemente”, ponderou a professora Miriam Pillar Grossi (UFSC) durante a primeira conferência.
Já na primeira mesa de debate do dia, composta por pós-doutorandas do INCT Caleidoscópio, Zizele Ferreira (UFCG) falou sobre os desafios para acesso e permanência de mulheres quilombolas nas ciências. Na segunda mesa, pesquisadoras dos Núcleos Feministas do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares (CEAM) mostraram como as pesquisas com perspectiva de gênero colaboraram para criação de políticas públicas para mulheres e população LGBTQIA+ e, por conseguinte, conquista de direitos.
“A primeira Delegacia de Atendimento Especial à Mulher de Brasília, em 1986, surgiu com a atuação do NEPeM (Núcleo de Estudo e Pesquisa sobre Mulheres - UNB). O NEPeM participou durante muito tempo do Conselho Distrital do Direito da Mulher, colaborando na construção de políticas públicas e cursos de capacitação”, explicou Ela Wiecko (UnB).
Além disso, no período da tarde, ocorreram seis comunicações simultâneas com distintos temas relativos à gênero, ciência e violências. Confira mais sobre o primeiro dia, clicando aqui.
Teorias e práticas antirracistas na universidade marcam segundo dia de evento
No segundo dia evento, as iniquidades raciais no sistema de ensino superior brasileiro foram o alvo do debate. A ideia do discurso como vetor de transformação para luta contra o racismo na Universidade foi apresentada pela pesquisadora Glenda Cristina Valim de Melo (UNIRIO).
“bell hooks vai dizer que nós fazemos das nossas palavras uma fala contra-hegemônica liberando nós mesmos da linguagem. Isso é importante porque é nessa circulação de textos, de narrativas, de discursos que nós podemos contar outras narrativas que sejam mais justas e coloquem a população negra como produtora de conhecimento e como aquela que deve estar na universidade sim. É preciso repetir essa narrativa até que ela fissure o pensamento racista que ocupa as universidades, de que esse é um espaço que não pertence a população negra”, analisou a pesquisadora
Ainda foi falado sobre epistemologias negras, desafios para as mulheres quilombolas mães permanecerem na universidade e para a valorização do conhecimento indígena no espaço acadêmico.
“O saber indígena, profundamente enraizado na relação com a terra, nas práticas comunitárias e na espiritualidade, oferece uma compreensão holística da vida e do universo que contrasta com a fragmentação do conhecimento ocidental. A presença de epistemologias indígenas na universidade vai além da inclusão de novos conteúdos curriculares. Ela desafia as bases epistemológicas da própria academia, exigindo uma reconfiguração das práticas pedagógicas e dos paradigmas de pesquisa”, explica Altaci Kokama (Altaci Rubim), da UnB.
Desafios para permanência do debate de gênero nas ciências marca último dia
No Brasil, um dos sintomas da crise do sistema de ensino superior remete à questão da equidade de gênero, raça e classe na universidade pública tanto como estudante, quanto como pesquisador e docente. Com o crescimento de políticas públicas focalizadas temos visto um discreto aumento da diversidade do corpo docente e discente das instituições, no entanto, as estatísticas ainda são desanimadoras.
Conforme apresentou a pesquisadora Karla Bessa, vice-coordenadora do INCT Caleidoscópio, durante mesa no último dia do seminário, embora o censo do Ensino Superior de 2023 (INEP) tenha divulgado números que informam sobre uma presença cada vez maior das mulheres no Ensino (58,4% das matrículas) e Pesquisa universitários, uma análise mais ampliada sobre onde estão inseridas essas mulheres (79,4% em cursos de graduação de IES privadas e maioria no modo EAD) e a seletiva participação delas nas universidades públicas, concentradas em áreas como Saúde e Humanidades, revelam que além de haver um desafio para inserção das mulheres junto às áreas de exatas e tecnológicas (STEM), há questões sociais e étnico-raciais que impedem de celebrar esse aparente avanço. O baixo índice de 22% de pessoas de 25 a 35 anos com um curso superior no país, indica que há um longo caminho para uma conquista efetiva de equidade e inclusão nas ciências. Além disso, a professora destacou também a necessidade da revisão nas hierarquias do conhecimento e no modelo neoliberal e mercantil de pensar o ensino e a pesquisa no país.
Os dados apresentados por Bessa demonstram o encontro do racismo e do machismo operando nas estruturas da educação brasileira, fato que também foi denunciado durante o ano de 2024 dentro dos espaços preparatórios para 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação - 5ª CNCTI.
As pesquisas científicas apresentadas pelas pesquisadoras durante os três dias de Seminário reforçam a necessidade da criação de um espaço e de uma agenda permanente para o debate de gênero, raça e demais iniquidades dentro das ciências, para compreensão de como essas desigualdades influenciam na construção do conhecimento e quais as possibilidades para superação desse cenário, reforçando a importância das ações desenvolvidas pelo INCT Caleidoscópio, como reforça Viviane Resende (Unb), coordenadora do INCT Caleidoscópio.
“O evento propiciou diálogo entre experiências diversas na universidade, olhares para a equidade nas ciências a partir de diferentes disciplinas, áreas, epistemologias. As pessoas presentes tiveram então uma rica oportunidade para repensar seus fazeres e alinhar suas lutas. Poder enxergar experiências concretas e modos de compreensão a partir de diferentes experiências, instituições, lugares pode provocar novos modos de ação e articulações. Esperamos poder também provocar gestoras e gestores de políticas públicas em ciência e tecnologia ao chamar atenção para o tema da equidade nas ciências”, pontua Resende.